Móvel velho
No canto da sala, um móvel,
imóvel, me olha com suas gavetas entreabertas. Lá estão elas: fotos desbotadas pelo tempo, memórias apagadas, recordações de outra era... Poemas inacabados, canções que nunca mais se escreveram. Eu olho sem querer vê-los. Puxo a gaveta emperrada. O tempo corrói minha vida. Abro um caderno antigo, visito poesias de eu-menina. Parece que se passaram mil anos, mas não. Lá está a cadeira de balanço numa foto amarelada e eu, pequena. Minha avó... Lembro dela. Cabelos brancos. Porta-retratos antigos e, as fotos arrancadas deles. Flores, muitas flores, sempre, eu te sonhava. Queria teu abraço aqui comigo. Tantas gavetas... poesias, poesias, poesias... Alguns textos tristes me matavam só de lê-los. Poemas duros, me gritavam pesadelos. Poemas de morte pra me lembrar que vivo. Em cada texto um encanto diferente... Fotos, Poemas, Agonias. Barulho de portas rangendo. Bendito, este móvel velho! Dentro dele uma vida se escondia. Poesias, poesias, poesias... Tantas gavetas emperradas neste móvel... Tantas gavetas, tantos textos, muita tinta... Fotos antigas e poesia misturadas. A noite cai. Muito papel, Foto da foto estampada. Um verso me sorri com um afago. Esse móvel me olha. Ele não entende a dor que só um poeta sente...
Valeska Caffarena
Enviado por Valeska Caffarena em 22/08/2024
Alterado em 22/08/2024 |